quarta-feira, 21 de março de 2007

Mosquitos têm sangue vermelho

Ele andava por aí, cabisbaixo como de costume, enquanto ela vinha de um outro lado - na mesma calçada - ela vinha de um outro lado, que ia além da visão que ele tinha. Mas ela via. De alguma forma, ela via. Foi aí que tropeçou nele propositalmente e o fez perguntar, no susto, tão atordoado como se nem lembrasse seu nome:

- Você vem sempre aqui?
- Só de vez em quando, mas já nos encontramos aqui antes.
- É, não é?
- É.

(pausa)

- E então, a gente não vai trepar?
- Ah, sim. Pode ser.
- "Pode ser"?
- É, como quiser.
- Podemos começar quebrando um pouco o gelo.
- Como da outra vez?
- Desculpe, eu não me lembro.
- Eu imagino, você estava drogado.
- Eu, drogado? Eu nunca usei drogas.
- Então você se fazia de drogado.
- Sim, isso é possível.
- E você era bem mais jovem. Sua aparência... Você parecia James Dean.
- É verdade. Não que o tempo tenha sido ingrato comigo. Se não fosse pelo acidente, minha aparência seria outra.
- Acidente?
- Sim, queimei meu rosto enquanto fritava um hambúrguer.
- Meu Deus!
- A frigideira pegou fogo, meu rosto ficou em chamas. Sofri três cirurgias plásticas, tenho problemas respiratórios desde então, mas pelo menos minha visão não foi prejudicada.
- Nossa, se você não tivesse me falado, não teria reparado.
- Obrigado.
- Mas eu continuo com uma aparência jovem.
- Você tem o que? Vinte e cinco?
- Trinta e cinco.
- Está muito bem.
- Obrigada... Sinta meu peito. Não é durinho?

Ele toca o seio dela.

- Aperte.

Ele aperta o seio dela.

- Sim, bem durinho. E que mamilo pequeno!

(gemido)

- E sensível.
- Você quer fazer aqui mesmo?
- Eu faria em qualquer lugar, com você.
- Eu estou desempregado. Moro num cômodo aqui perto. Não é o melhor dos lugares, mas teremos alguma privacidade.
- Eu não quero privacidade.
- Então não sei como faremos.
- Bota o pau pra fora.
- Não.
- Não?
- Não aqui.
- Acho que meu celular está tocando. Espera um pouco.

Ela se vira de costas e fuça sua bolsa. Ele olha a bunda dura dela, apertada no shorts jeans. Ela atende ao telefone e fica eufórica. Ele observa a nádega esquerda tremer de excitação. O pé esquerdo dando tapinhas no chão. Aquele tamanco, aquelas unhas vermelhas. Uma tatuagem desbotada no calcanhar. Uma borboleta? Ela grita coisas desconexas, meio demente, ele pensa, e ela desliga com um "eu te amo".

- Eu preciso ir, agora.
- Não, não vá. Podemos fazer aqui.
- Eu não quero mais.
- Não faça isso comigo.
- Eu não sou uma puta, sabia?
- Eu sei.
- Tchau, então. Foi um prazer revê-lo.
- O prazer foi meu.

Ela atravessa a rua, correndo. Começa a chover, ela abre o guarda-chuva. Olha para trás. Sorri. Some numa esquina. Ele acende um cigarro. Deixa a chuva molhar seu rosto. Olha para o chão. E lá está... A chave!

- Que porra é essa?

Ele joga o cigarro fora, pega a chave. É uma chave dourada, pequena. Não parece ser chave que abra algo que preste, mas ele a guarda mesmo assim. Não existem tantos segredos assim, numa esquina como aquela.

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