domingo, 11 de março de 2007

Lúcio



Deixe-me apresentar. Sou Lúcio. Da vida eu não faço nada que mereça crédito. Eu só fodo. Todos os meus passos terminam dentro do rabo de alguém, e parecia tudo bem até hoje. Parecia tudo bem até a volta para casa, com o gosto da rola de gente que eu não conheço o rosto, esse gosto azedo de rola em minha boca.

Não tive uma criação religiosa. Não sinto culpa, não é isso o que sinto. Eu sinto um vazio permanente que eu não sei se deriva de minha promiscuidade. Não sei nem se sou promíscuo. Eu sei que busco alguma coisa --- eu busco o amor e a beleza das coisas. Que coisas? As coisas todas que estão no beco --- é lá que eu procuro. Eu acho que o amor é orgânico e o sinto vivo enquanto fodo. Ou esta é só uma desculpa? Eu sinto uma rola grossa abrindo espaço entre minhas nádegas, cutucando meu ego no fundo do meu cu. É isso: eu sou meu ego e eu não sei quem sou.

A verdade é que não sou escritor. Peço perdão ao leitor que perde seu tempo com estas palavras de um infeliz libertino: eu sei que o sexo assim, exposto na sua cara, está ultrapassado. Mas como usar metáforas e eufemismos quando tudo o que me vem na cabeça é o cheiro da merda? Um cheiro azedo de merda e porra. Ou é assim que cheira uma trepada, ou este é meu perfume natural...

Já fodi assim outras vezes. Outros dias. Mas hoje aconteceu de eu pensar em amor-burguês. Hoje dei para idealizar este amor e imaginar a sensação de ser tratado como uma beleza frágil, que pode se partir em mil pedacinhos. Uma peça rara, dessas que se coloca em destaque numa sala de estar. Dessas que se exibe com muito orgulho, entre objetos de menor valor. Hoje dei para pensar que este sou eu: uma peça rara e delicada, que exige cuidados. Um falo de vidro? Não, acho que não...

Olhei meu corpo no espelho a pouco e fiquei encantado. Como dizer? fiquei encantado mesmo... Vi uma beleza pura ali, refletida. Um corpo cheirando à lubrificante. Um pau doendo. Um cu latejando --- o gosto em minha boca, o cheiro que sai do meu rabo, tudo me deixa com ânsia --- eu preciso parar de beber --- tudo me deixa com ânsia, mas por trás das marcas no corpo, há uma beleza. Há beleza em garotos que procuram não-sei-o-que e se oferecem, fáceis, aos outros. Há uma fragilidade nessa entrega, uma dor-no-peito que me faz chorar! Um garoto exposto assim entre pessoas nuas, procurando beleza nestas pessoas nuas e no que elas fazem com seus corpos, este garoto está perdido. E eis a beleza toda!, na minha cara, diante do espelho.

Diante do espelho, pela primeira vez, acredito ter chegado perto de uma definição. Aquele era eu: um moleque em pé diante do susto. Com as pernas bambas – e um sorriso triste – era um moleque. Nada mais que um moleque que – finalmente! – entendeu sua sina.


Imagens: auto-retratos

5 comentários:

  1. Como transformar esse mundarel de palavras feias em poesia? Aí está! Você sabe como!
    Eu estou encantado e boqueaberto. Meus parabéns, guri!

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  2. Acho bom deixar bem claro para os amigos chocados que eu NÃO SOU o Lúcio. Pelo menos não dessa forma.

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  3. se você não é o Lúcio, então quem é você? :)

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  4. (risos)
    Eu posso trepar como o Lúcio e sentir diferente --- sou um bom observador.

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  5. Lúcio... tão vítima e vazio como minha querida Maca, Macabéa minha amada.
    Tão opostos e tão iguais.
    Não sei se devo sorrir ou se devo chorar, Lúcio não me espanta mais... passou a fazer parte de nosso mundo contemporâneo.

    Luto para não ser Lúcio........ Lúcio luta para me ser?

    Sou louco, tu também o é?

    Somos Lúcio? Ele me é?

    Dúvidas, questionamentos pairam em minha inútil massa encefálica...
    Se 'falo' ela é realmente inútil.

    Melhor 'falar' ou pensar???





    Seguirei o caminho do meio...




    O Louco

    www.uniblog.com.br/palavrasdeumlouco

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